Mais de um terço das ligações de longa distância do Brasil para o exterior é feita por meio de empresas que não têm licença da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para atuar no setor.
A conclusão é de um estudo que a Abrafix, associação das concessionárias de telefonia fixa, encomendou à consultoria BDO Trevisan para traçar o cenário da competição no mercado. Os números mostram o rápido avanço da tecnologia de voz sobre protocolo de internet (voz sobre IP), que barateia as chamadas internacionais.
De acordo com o levantamento, as operadoras chamadas de "ilegais" pela Abrafix representaram 36% do tráfego de ligações do Brasil para o exterior no ano passado. Em 2003, o número foi de 28%. Com isso, as empresas de telefonia deixaram de faturar R$ 880 milhões e de repassar R$ 252 milhões em impostos no ano passado.
Os valores ainda são pequenos. Juntas, as concessionárias de telefonia fixa (Telemar, Telefônica e Brasil Telecom) faturaram perto de R$ 50 bilhões no ano passado - excluídos os serviços de celular. Porém, o ritmo de crescimento preocupa o setor, que tem pedido uma revisão do ambiente regulatório.
"Os objetivos para o setor têm se partir do governo. Talvez não se esteja percebendo a importância do que está acontecendo", diz o presidente da Abrafix, José Fernandes Pauletti.
O sistema funciona da seguinte maneira: por meio de uma rede IP, a operadora "ilegal" completa a ligação internacional num PABX local, direcionando a chamada para a rede pública como se fosse uma ligação local. O serviço é oferecido geralmente por empresas estrangeiras, muitas das quais têm autorização para prestar telefonia em seus países de origem. Elas atuam em duas vertentes.
No modelo mais antigo, as companhias vendem cartões telefônicos internacionais. Por meio deles, o usuário liga para um número que direciona a chamada para o exterior para uma rede IP. Serviços como esse são muito populares em países como os Estados Unidos.
Porém, a grande preocupação das operadoras é com empresas que oferecem ligações - gratuitas em alguns casos - por meio de softwares baixados pela internet. Com eles, é possível fazer chamadas de um computador para outro ou para um telefone convencional. O "bicho-papão" das teles é o Skype, que se tornou popular no mundo todo. Mas os executivos do setor não ousam citar o nome dele. Costumam classificá-lo como "aquele software que você sabe qual é".
Segundo Pauletti, as chamadas entre dois computadores não são ilegais. "É um serviço privado, de internet. O problema é quando passam pela rede pública", afirma.
A legislação brasileira estabelece que somente empresas autorizadas pelas Anatel podem prestar serviços de telefonia. É com base nisso que as operadoras apontam a ilegalidade dos softwares ou das empresas que usam cartões.
No entanto, a tecnologia de voz sobre IP está jogando por terra esse conceito. Como impedir que alguém use um software como o Skype? E por que proibir o consumidor de usar um sistema que pode ser mais barato?
Questões como essas estão em aberto na Anatel. Por enquanto, a agência tem considerado voz sobre IP como um serviço de internet, que não precisa ser regulado. É o mesmo posicionamento adotado pela FCC, órgão que dita as regras das Telecomunicações nos EUA - o que tem gerado uma chiadeira geral das operadoras por lá.
No Brasil, as teles estão tateando o mercado. Até agora, nenhuma lançou serviços de voz sobre IP. Como têm posição dominante no mercado, as concessionárias têm atuado na defensiva.
A ameaça ainda é distante. O país fechou o ano passado com 2,1 milhões de acessos em banda larga, um requisito para o uso de telefonia IP. Porém, o levantamento da Trevisan estima que, em 2009, haverá quase 7 milhões o número de usuários de voz sobre protocolo de internet no mercado brasileiro. No ano passado, havia 1 milhão.
"Para o consumidor é bom, desde que os competidores tenham licença e atuem dentro das regras", afirma o diretor de estratégia corporativa da Telemar, André Bianchi. "O problema são esses parasitas da internet que destroem valor em toda a indústria."
Talita Moreira
Valor Econômico
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